terça-feira, 25 de setembro de 2007

Pandemia

O caso é grave, doutor. O prognóstico não é bom. O vírus é mutante e letal. A crise atravessou o Atlântico. Não aquela de que falava nosso desfavorecido molusco. Aquela crise, como sabemos, foi morta a canetaços por ordem do eneadáctilo caeteense. O batráquio barbudo não perderia a oportunidade de tomar para si o mérito da salvação. Falando na Zoropa e não satisfeito com a exibição de conhecimento geográfico, que seguramente não adquiriu na escola, demonstrou entusiasmo nos comentários sobre economia. Falo de outra crise. Não sei bem que rumo tomou, mas o fato é que chegou a Nova Iorque.

Mahmoud Ahmadinejad, o número dois no governo iraniano, foi participar da Assembléia Geral da ONU. Quis aproveitar para visitar o Ground Zero, onde ficavam as torres gêmeas, mas não foi possível, apesar de o local estar dentro do raio de 25 milhas de distância em que os diplomatas e representantes internacionais têm assegurado direito de transitar. Seria curiosidade de turista? Muita propaganda foi feita sobre os memoriais ali construídos. Eu também gostaria de conhecer o lugar. Ou será que é orgulho de artista? Infelizmente a polícia de Nova Iorque não permitiu a visita. Daria muito trabalho. É um lugar aberto. Imaginem o tumulto... muita confusão. Melhor evitar.

Em uma fantástica demonstração de liberdade de expressão, Ahmadinejad foi convidado a falar na Universidade Columbia, criando grande alvoroço. Dizem por lá que os ingressos para assisti-lo esgotaram mais rápido que os ingressos para show do Bruce Springsteen. A universidade estava prestes a realizar um experimento antropológico. Nem a mulher barbada e o homem que engolia vespas conseguiram atrair tanta atenção. As filas só não eram maiores que as do zoológico. Alguns setores da população ganharam as ruas em protesto. Carregavam placas e faixas ao redor do campus enxotando o inimigo. O próprio presidente da Universidade Columbia, Lee C. Bollinger, abriu os trabalhos com um ataque verbal forte, descortês e nada sutil ao presidente iraniano. Não era preciso. Era uma excelente oportunidade para conhecer melhor o líder persa, uma oportunidade para mostrar-lhe o que o Ocidente tem a oferecer. Que orgulho! Uma civilização que permite ao suposto inimigo exibir suas idéias contra a mesma civilização que o recebe! Fico satisfeito ao ver um crítico do Ocidente participando de nossos rituais democráticos. Fico feliz ao ver que ainda existem universidades autônomas, livres de pressões governistas, universidades que privilegiam o conhecimento e não temem os métodos democráticos. Quem diria que um eminente líder de um país totalitário participaria de uma Assembléia Geral e de um debate universitário! Um repórter não desfruta dessas regalias no Irã. Um iraniano não desfruta dessas regalias no Irã. Um iraniano no Irã pode falar livremente sobre todos os assuntos, menos o que é proibido. Excetuando algumas proibições, são livres! Um lugar maravilhoso! Mulheres livres para exercerem seus deveres e obedecerem as leis religiosas! Homens livres para trabalharem corretamente pela grandeza da nação! Jovens livres para estudarem o que quiserem entre as opções oferecidas pelo governo e sobre a grandeza iraniana.

Ahmadinejad é louco, mas não é burro. Moderou seu discurso. Não respondeu as provocantes perguntas do Sr. Bollinger da mesma forma que faria em casa. Esquivou-se dos ataques com habilidade, coisa que já não se vê mais por aqui, desconversou, evitou vaias e ainda falou sobre o amor a todos os povos.

A Universidade Columbia perdeu uma excelente oportunidade de aplicar um antígeno contra pandêmico patógeno da burrice, a mais mortífera e contagiosa inópia humana. Quantos alunos necessitados estão reunidos em Nova Iorque! Aulas de história, sociologia, política, direito internacional, comércio internacional, economia e tudo aquilo que falta naquelas cacholinhas ocas. No currículo também constaria geografia, conhecimento de extrema necessidade aos campeões das gafes. Já imagino o professor apontando no globo terrestre e dizendo: “Austrália e Áustria são dois lugares diferentes. Um fica na Oceania, perto da Indonésia. O outro, lá na Europa, perto da Alemanha. O oceano Atlântico...”

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