segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Sobre as patologias

Perder a virgindade é sempre difícil, ainda mais quando não se conhece direito o(a) parceiro(a); apesar disso, meu temperamento temerário me impele as escolhas mais complicadas, quase sempre com resultados desastrosos. Espero que esse não seja o caso desse breve comentário.

Não li a Veja, outros blogs de cinema, no máximo a crítica da Cinética. Muita coisa chegou aos meus ouvidos por conversas - principalmente sobre a tal publicação - e outras simplesmente através de uma pesquisa superficial que eu fiz pela internet por causa do frisson das últimas semanas. Em geral, muita bobagem, mas que me fez perguntar: por que um cara como o Ruy Gardnier avalia com três estrelas Tropa de Elite? Fui assistir e gostei.

Reduzí-lo a propaganda do BOPE ou argumentar que ele aponta o usuário como sócio do tráfico é, pra ser gentil, inocência; um lapso de conceito básico: o discurso do personagem principal não é, necessariamente, o discurso do filme. Alguém já viu propaganda do exército mostrar cenas de combate ou tortura? Como o usuário pode ser acusado de sócio do tráfico se a todo momento ele está acuado, pressionado tanto pela polícia como pelos traficantes? Não, as primeiras impressões não devem ser finais, ainda mais quando se trata de temas conturbados.

E principalmente, no que tange o personagem principal, o Nascimento, nome ironicamente colocado ao lado de uma caveira. Pra começar, a brutalidade característica do soldado não impede ele de se sensibilizar com umas coisas que, na realidade do filme, não deviam passar de bobagem, numa ligação com "Nascido pra Matar", do Kubrick, que pra mim é quase direta. Lá, o personagem do repórter, é ao mesmo tempo consciente dos absurdos da guerra e agente deles, criando uma ambigüidade sufocante; aqui, a discrepância entre o senso torto de justiça de Nascimento e o prazer violento com que ele aplica essa justiça à la grupo de extermínio é aviltante. Ele faz umas coisas que me deixam puto e ao mesmo tempo não posso deixar de caminhar ao lado dele através desse labirinto de paradoxos, imergindo nas vielas do morro carioca, AR-15 na mão, cada vez mais dentro de um lodaçal que só piora, olhos perplexos de frente pro círculo vicioso de corrupção e cinismo que se tornou a favela.

3 comentários:

Enio Sam disse...

Eu desviei o quanto pude sobre notas desse filme, sabe? Somente ontem, depois de dizer não ao convite pra assistir, refleti um pouquinho. Só aí fui ler mais sobre o filme. E continuei com a mesma vontade de não passar duas horas trancado olhando aquilo. Esse bla bla bla todo é pra dizer que vc quase me convenceu com teu texto bacana, o único que conversou de verdade comigo sobre o tal filme 'imperdível'.

Abs!

Unknown disse...

Eu nunca gosto de primeira dos meus textos, o que é quase regra pra maioria das pessoas que eu conheço. Saber que alguém gostou é quase um alívio.

Se tu te recusa a ver, normal. Mas sobre o assunto, caso interesse, também tem o 'Notícias de uma guerra particular'.

Abs. =)

Dona Paula. disse...

perdao pela falta de acentos,mas ai vai:
assisti o filme.

depois de zunzunzuns e tititis, comprei o ingresso e arrisquei. sai como se tivesse levado um soco no estomago...
li de novo teu comentario, e vim comentar: concordo e concordo! quem diz que o filme faz do nascimento um heroi, propagando do bope e blabla, sei la, deve ter assistido enquanto cochilava, ou o diabo...

recomendo!